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Violência contra a mulher e saúde: principais impactos no direito brasileiro

  • Foto do escritor: Andreza  Jacobsen
    Andreza Jacobsen
  • 10 de fev.
  • 8 min de leitura

Atualizado: 11 de fev.



A violência contra a mulher no Brasil, além de ser uma grave violação dos direitos humanos, apresenta sérios impactos no campo da saúde pública e principalmente no sistema jurídico. A relação entre saúde e direito é crucial, pois as consequências físicas, psicológicas e sociais da violência exigem uma resposta integrada entre políticas públicas, serviços de saúde e sistemas de justiça. No Brasil, apesar da legislação tem buscado enfrentar essa questão, mas ainda existem desafios significativos no que tange à efetividade de sua aplicação e à resposta das instituições envolvidas.


A violência contra a mulher se apresenta de várias formas — física, psicológica, sexual, patrimonial, entre outras,  e todas têm consequências devastadoras para a saúde das vítimas. O impacto da violência não se limita às lesões físicas imediatas, mas abrange uma série de efeitos de longo prazo. Algumas consequências que se propagam com efeitos irreversíveis as mulheres são: 


  1. Consequências Físicas


    As agressões físicas resultam em contusões, fraturas, lesões graves e podem até levar a morte. Desse modo, as vítimas de violência doméstica, por exemplo, apresentam comumente traumas físicos que podem deixar sequelas permanentes. Em demasiadas vezes essas mulheres vítimas, também têm um risco elevado de dano neurológico devido à violência repetida, o que afeta suas funções cognitivas e motoras.


  2. Consequências Psicológicas


    A violência psicológica é tão ou mais devastadora que a física, podendo causar transtornos psicológicos como depressão, transtornos de ansiedade, síndrome do pânico, transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) e até tentativas de suicídio. A causa do medo devido às constante de agressões, o isolamento social e o controle emocional promovido por agressores afetam profundamente a saúde mental da mulher.


  3. Consequências Reprodutivas e Sexuais


    Já a violência sexual contra a mulher pode resultar em gravidez indesejada, doenças sexualmente transmissíveis (DSTs), infertilidade e complicações na saúde reprodutiva. Além disso, o abuso sexual contínuo pode causar sérios traumas emocionais e psicossociais, afetando a autoestima e o relacionamento da mulher com sua própria sexualidade.


  4. Impactos no Sistema de Saúde


    A violência contra a mulher também impõe uma carga significativa ao sistema de saúde pública, que precisa fornecer cuidados médicos, psicológicos e sociais para as vítimas. Em demasiadas vezes as vítimas de violência não buscam ajuda por medo de retaliação ou vergonha, o que torna a tarefa de identificar e tratar esses casos ainda mais difícil. Outrossim, a violência pode resultar em custos elevados para o tratamento das sequelas, seja no âmbito de atendimentos médicos urgentes, seja em tratamentos psicológicos de longo prazo.


O direito brasileiro, nos últimos anos, tem dado evoluído no combate à crescente violência contra a mulher, reconhecendo-a como uma questão de saúde pública, direitos humanos e igualdade de gênero. O Código Penal Brasileiro, a Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio são algumas das principais ferramentas legais para enfrentar esse problema. O Código penal brasileiro traz em seu artigo 129, a Lesão Corporal: que trata das agressões físicas que causam dano à integridade da vítima. Por exemplo, quando a vítima é uma mulher, a violência física pode ocorrer no contexto da violência doméstica ou em relações de convivência. As lesões corporais são divididas em:


  • Lesão Corporal Leve: Quando a lesão não exige tratamento médico ou que cause sofrimento físico.

  • Lesão Corporal Grave: Quando há deformidade permanente, perigo de vida ou perda de um membro, função ou órgão.

  • Lesão Corporal Gravíssima: Quando a lesão coloca a vida da vítima em perigo ou causa incapacidade permanente para o trabalho.


A Lesão Corporal mencionada no âmbito da violência doméstica (Art. 129, § 9º, CP) refere-se a Lei Maria da Penha, que além de criar uma série de medidas de proteção, também prevê que as lesões corporais, quando cometidas dentro de um contexto de violência doméstica e familiar, sejam tratadas com penas mais severas. Isso pode incluir penas mais altas para os agressores, dependendo das circunstâncias do crime. No caso da violência doméstica, a pena de lesão corporal leve pode ser aumentada, levando em conta a habitualidade da agressão e o risco para a integridade física e psíquica da mulher.


Outro crime previsto pela legislação penalista que envolve a violência contra a  mulher é a conduta de ameaça prevista no artigo 147 do Código Penal, e pode ser configurada quando alguém ameaça causar mal injusto e grave à mulher. A ameaça pode ocorrer em um contexto de violência doméstica ou qualquer outro relacionamento em que o agressor use do medo para controlar ou intimidar a vítima. A pena para o crime de ameaça pode ser agravada se ocorrer no contexto da violência doméstica, como previsto pela Lei Maria da Penha.


Outro tipificação penal que afronta diretamente a integridade física e mental das mulheres é o estupro, que é um crime contra a liberdade sexual da mulher e está previsto no artigo 213 do Código Penal. Ele ocorre quando há constrangimento sexual mediante violência ou grave ameaça. O Código Penal tipifica também o estupro de vulnerável (quando a vítima é incapaz de oferecer resistência, como no caso de menores de 14 anos ou pessoas com deficiência), com penas mais graves. O estupro é uma forma extrema de violência contra a mulher e, em muitos casos, está relacionado com relações de poder, controle e dominação, que são características de contextos de violência doméstica.


Em termos de legislação específica sobre crimes contra a mulher anexadas no rol taxativo do direito penal esta Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) foi um marco importante na legislação brasileira, criando mecanismos de proteção às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar. Ela prevê medidas como tratamento especializado, assistência jurídica e psicológica e políticas públicas de prevenção. Além disso, garante que as vítimas possam obter medidas protetivas de urgência, que incluem o afastamento do agressor do lar e a proibição de contato com a vítima. A Lei Maria da Penha tem como princípio a integralidade do atendimento à mulher, ou seja, que a vítima tenha acesso a uma rede de serviços de saúde, justiça e assistência social. Isso implica em um atendimento especializado em unidades de saúde, como hospitais e postos de saúde, que devem ser preparados para identificar sinais de violência e oferecer o suporte adequado.


A lei do feminicídio inserida no Código Penal pela Lei nº 13.104/2015 configura-se  como um tipo qualificado de homicídio que caracteriza o assassinato de uma mulher em razão do gênero, isto é, pela condição de ser mulher. O feminicídio pode ocorrer em um contexto de violência doméstica, familiar ou em situações de desprezo à condição de mulher. Da mesma maneira, também pode se aplicar a crimes cometidos por pessoas com quem a mulher tenha ou tenha tido vínculo afetivo ou sexual. Por isso, a pena para o feminicídio é de 12 a 30 anos de reclusão e, caso o crime envolva circunstâncias agravantes (como tortura ou crueldade), pode ser aumentada. 


A questão da criminalização do feminicídio como um tipo qualificado de homicídio, ou seja, o ceifar a vida de mulheres por questões de gênero, foi um passo importante para o enfrentamento da violência extrema contra a mulher. A tipificação do feminicídio permite uma resposta mais rigorosa e eficaz do sistema de justiça, e também coloca o Brasil como um dos países que reconhece o fenômeno da violência de gênero com maior clareza.


 Além do papel da justiça no combate a violência, o aporte da área da saúde tem servido de base para a  implementação de políticas de saúde voltadas para o atendimento de mulheres vítimas de violência.  Por exemplo, algumas cidades brasileiras contam com centros de atendimento especializado para mulheres em situação de violência, que oferecem serviços multidisciplinares, incluindo apoio jurídico, psicológico e social. Desse modo, essas unidades são parte da rede de apoio às vítimas, permitindo que essas vítimas, tenham acesso a um atendimento contínuo e adequado. Em casos de risco de morte ou novas agressões, as casas abrigo são alternativas para garantir a segurança das vítimas, proporcionando um local seguro e sigiloso onde a mulher pode permanecer temporariamente, longe do agressor. Essas casas funcionam como espaços de acolhimento e proteção.


Como política pública de saúde primordial à saúde da mulher, o SUS tem um papel central quanto ao Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para o atendimento às mulheres em situação de violência define as diretrizes para os profissionais de saúde. As orientações e identificações precoces, o acolhimento, o atendimento médico e psicológico, o encaminhamento para a rede de apoio social e jurídico são condutas essenciais que o SUS deve garantir o atendimento integral às mulheres. 


Apesar de atuar em conjunto, as área da justiça e da saúde ainda enfrentam um sistema cheio de desafios em relação à formação e capacitação dos profissionais de saúde, e também do direito, que muitas vezes não têm preparo adequado para lidar com casos de violência de gênero de forma sensível e eficaz. A violência contra a mulher ainda enfrenta grandes desafios no Brasil, tanto do ponto de vista jurídico quanto no sistema de saúde, sendo eles:


  1. Subnotificação e Falta de Denúncia


    Muitas mulheres vítimas de violência não denunciam seus agressores, seja por medo, vergonha ou falta de apoio. Isso resulta em subnotificação, dificultando o diagnóstico e tratamento adequado. Muitas mulheres também não buscam serviços de saúde devido ao medo de serem julgadas ou rechaçadas.


  2. Capacitação Insuficiente dos Profissionais de Saúde


    A falta de formação adequada dos profissionais de saúde sobre a violência de gênero é um obstáculo para a identificação precoce dos casos. O atendimento médico e psicológico inadequado pode agravar o sofrimento das vítimas e impedir que elas recebam o tratamento necessário.


  3. Desigualdade no Acesso aos Serviços


    Em áreas rurais ou em comunidades mais afastadas, as mulheres têm acesso limitado aos serviços de saúde e à rede de apoio jurídico. A desigualdade no acesso a esses serviços pode dificultar a efetividade das políticas públicas e perpetuar a situação de violência.


  4. Impunidade e Falhas no Sistema Judiciário


    A impunidade em casos de violência contra a mulher ainda é um problema no Brasil. O sistema judiciário muitas vezes lida com esses casos com demora e falta de sensibilidade, o que dificulta a busca por justiça e proteção para as vítimas.


Logo, a violência contra a mulher é uma questão que compete a saúde pública, pelos impactos ocorridos que afetam o bem-estar físico e mental das vítimas, e que impacta no sistema de justiça e nas políticas públicas. Por isso, o Brasil tem avançado consideravelmente na criação de legislações e políticas para proteger as mulheres, como a Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio, além de oferecer atendimento especializado no sistema de saúde por meio do SUS e outros políticas assistenciais. 


No entanto, os desafios persistem, como a subnotificação, a falta de capacitação profissional e a desigualdade no acesso aos serviços de saúde e justiça. Além do mais, para que o Brasil enfrente de forma eficaz a violência contra a mulher, é necessário fortalecer os objetivos das legislações protetoras ao promover a educação para a igualdade de gênero e também reforçar  o acesso universal a serviços de saúde e justiça para todas as mulheres. Portanto, uma abordagem holística em conjunto justiça e saúde possibilitará mudanças significativas no panorama atual vivenciado por essas mulheres. 



Núcleo Científico Interno (NCI)

Me. Andreza da Silva Jacobsen

Esp. Edmundo Rafael Gaievski Júnior.



REFERÊNCIAS 


BRASIL. Lei Maria da penha. Lei n.°11.340, de 7 de Agosto de 2006. Disponível: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm.Acesso em: 10 fev. 2025.


BRASIL. Lei nº 13.104, de 9 de março de 2015. Altera o art. 121 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, para prever o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio, e o art. 1º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990, para incluir o feminicídio no rol dos crimes hediondos.Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13104.htm. Acesso em: 10 fev. 2025.


SILVA, Monize Priscila. Feminicídio e Lei Maria da Penha. Uma análise dos instrumentos de  enfrentamento à violência de gênero no Brasil. Percurso Acadêmico, Belo Horizonte, v. 12, n. 22, jan./jun. 2022. Disponível em: https://periodicos.pucminas.br/index.php/percursoacademico/article/view/26380/19027. Acesso em: 10 jan. 2025.

 
 
 

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