Usucapião familiar e suas consequências
- Andreza Jacobsen
- 1 de nov. de 2024
- 3 min de leitura
Após o termino da relação conjugal surge a dúvida sobre a questão: se eu sair de casa configura o abandono de lar e com isso há a perda dos direitos sobre o imóvel que antes pertencia ao casal? A resposta é: depende do caso concreto. Para embasar o exemplo de perda da propriedade pelo cônjuge que abandona o lar, o Código Civil em seu artigo 1.240-A traz que :
"Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade dívida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural".
Desse modo, para que haja a configuração do abandono do lar pelo ex-cônjuge, o ato de abandonar deve ser voluntário e injustificado, sendo assim, o cônjuge que permanece no imóvel adquirirá o domínio ou a propriedade integral do bem.
Assim, conforme o dispositivo de lei em tela, pode um cônjuge ou companheiro usucapir a meação do outro relativamente a imóvel urbano cuja propriedade entre eles seja compartilhada, desde que o bem tenha área inferior a 250m² e seja objeto de posse por dois anos ininterruptos, sem oposição do outro consorte que abandonou o lar conjugal.
Logo, os requisitos para a configuração do usucapião familiar são: a) ser o imóvel propriedade comum do ex casal, comprovado através da matrícula do imóvel; b) imóvel de até 250m2; c) utilização do imóvel como moradia; d) exercer por 2 anos posse direta e ininterrupta sobre o imóvel após o abandono do lar pelo ex-companheiro; e) existir abandono do lar pelo ex-companheiro; f) inexistência de oposição ou ação judicial com relação ao imóvel, pelo ex companheiro; g) inexistência de propriedade de outro imóvel urbano ou rural por quem pleiteia a usucapião familiar.
Porém, embora tenham todos esses requisitos positivos por parte de quem permanece no imóvel do casal, há outros que também protegem o ex-cônjuge que foi denominado abandonar de dar. Mas, e como se configura o abandono? É considerado abandono de lar segundo Rodrigo da Cunha Pereira aquele cônjuge que literalmente some, sem deixar notícias, por 2 anos ininterruptos sem prestar qualquer auxílio aqueles (a) que permaneceu no imóvel.
Desse modo, a legislação civil visou penalizar o ex-cônjuge que abandona o lar, pois, este saiu sem cumprir com suas responsabilidades, não deixando sequer informações sobre seu atual panorama de vida. Lembrando aqui que não se trata da discussão de culpa em relação à conjugalidade, mas, de responsabilização sobre os atos de quem deixa o lar. Ninguém é obrigado a ficar casado ou numa relação desarmônica porque pode perder um bem, a convivência não é obrigatória, todavia, há o dever de auxílio dos filhos e assistência a ex-cônjuge em vulnerabilidade econômica.
Por consequência da falta de assistência e abandono sem notícias pelo período de tempo de 2 anos ininterruptos incorrerá nos requisitos de abandono de lar o que ocasionará diretamente a perda do bem considerado de família. Um caso exemplo de cônjuge que abandona o lar é aquele que dá notícias posteriormente sobre aonde se encontra, mas, apenas entra em contato e não oferece qualquer assistência, dessa maneira também incorrerá em abandono de lar, e consequentemente na perda do bem imóvel. Então de modo justo, e, visando o equilíbrio entre as partes a legislação civil mediante motivos plenamente justificáveis, é autorizado a perda do bem por aquele que abandonou o lar, pois, não agiu de certa forma de boa-fé.
Logo, a responsabilização é apenas a consequência da lacuna de assistência deixada pelo ex-cônjuge, pois, do contrário se houvesse o auxílio não geraria a perda do bem. Outro ponto importante é que o Código Civil em diálogo com a Constituição Federal reserva esse bem para aquele que permanece no imóvel, e em casos de relações conjugais em que se configura a violência doméstica o agressor deve ser distanciado do lar, pela própria segurança da vítima. Nesse caso, o lar é considerado um bem sagrado, protegido via constitucional para que mantenha protegido um bem maior que é a vida e o bem-estar da vítima, seja ela homem ou mulher. Portanto, a responsabilização da perda gerada pelo abandono do lar sempre deve ser verificada, mediante a análise e fundamentação de cada caso concreto.
Núcleo Científico Interno - (NCI)
Dra. Andreza da Silva Jacobsen
Dr. Edmundo Rafael Gaievski Junior
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm?ref=blog.suitebras.com. Acesso em: 01 nov. 2024.
MENEZES, Karol. Requisitos da Usucapião Familiar. Jusbrasil. 2016. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/requisitos-usucapiao-familiar/448838779. Acesso em: 01 nov. 2024.
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Entenda o que é abandono de lar e suas consequências para o Direito de Família. 2021. Disponível em: YouTube. Acesso em: 01 nov. 2024.
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