Sobre a Usucapião de Bens Imóveis e Móveis
- Andreza Jacobsen
- 17 de mar.
- 5 min de leitura
A usucapião é forma originária de aquisição da propriedade, que é cabível tanto para bens imóveis, quanto para bens móveis. No que tange à usucapião de bens móveis, são admitidas as formas ordinária e extraordinária. A ordinária ocorre quando alguém possuir coisa móvel como sua, contínua e incontestadamente durante três anos, com justo título e boa-fé, conforme leitura do art. 1.260 do CC/2002. Já a forma extraordinária ocorre quando a posse da coisa móvel se prolongar por cinco anos, o que independe de título e boa-fé. Ressalte-se, portanto, que o princípio que norteia a usucapião dos móveis é o mesmo que inspira a usucapião dos imóveis, isto é, o intuito de emprestar juridicidade a situações de fato que se alongaram no tempo.
Ressalte-se que se aplicam à usucapião de bens móveis o previsto nos arts. 1.243 e 1.244 do CC/2002, logo, o possuidor pode para fim de contar o tempo exigido para a usucapião, acrescentar à sua posse ao dos seus antecessores, contanto que todas sejam contínuas e pacíficas. A segunda regra determina que se estende ao possuidor o disposto quanto ao devedor em relação às causas que obstam, suspendem e interrompem a prescrição.
De outro lado, na usucapião de bens imóveis, há diversas modalidades: extraordinária, ordinária, especial urbana, especial rural, imobiliária administrativa, indígena, familiar e extrajudicial. A usucapião extraordinária vem disciplinada no art. 1.238 do CC/2002 e possui como requisitos: posse de quinze anos exercida com ânimo de dono de forma contínua, mansa e pacífica. São dispensas o requisito do justo título e da boa-fé. Na usucapião extraordinária, o prazo pode diminuir para dez anos se o possuidor tiver estabelecido moradia no imóvel ou realizado obras ou serviços de caráter produtivo.
A usucapião ordinária, por sua vez, apresenta como requisitos a posse de dez anos, exercida com ânimo de dono, contínua, mansa e pacificamente e ainda, o justo título e a boa-fé, conforme disposição do art. 1.242. O prazo será de cinco anos se o imóvel tiver sido adquirido onerosamente, com base em título no cartório, cancelado posteriormente, desde que os possuidores tiverem estabelecido sua moradia ou realizado investimentos de interesse social e econômico.
Tem-se ainda a chamada usucapião especial, também chamada de constitucional, por vir prevista na Constituição da República por meio de duas formas: rural e urbana.
A usucapião especial rural, disciplinada no art. 191 da CF c/c art. 1.239 do CC/2002 dispõe: 5 A Advocacia Imobiliária Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona rural não superior a cinquenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.
Assim sendo, possui o principal objetivo de fixar o homem no campo exigindo essa ocupação produtiva do imóvel, devendo neste morar e trabalhar. Nesta modalidade de usucapião, não se permite a chamada “accessio possessionis”, ou seja, não poderá o possuidor acrescentar à sua posse a dos seus antecessores, pois teriam que estar presentes as qualidades das posses adicionadas, que se tratando de imóvel rural, seria difícil de ocorrer.
Como dito, há também a usucapião especial urbana, prevista no art. 183 da Constituição, reproduzidas pelo CC/2002 e o art. 9º do Estatuto da Cidade: Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
Cumpre ressaltar que essa modalidade não se aplica à posse de terreno urbano em construção. Há que se destacar que o Estatuto da Cidade ainda prevê a usucapião urbana coletiva, no seu art. 10. Consiste na usucapião por população de baixa renda de moradia urbana por cinco anos, onde não é possível identificar os terrenos ocupados individualmente. Essa inovação busca possibilitar a regularização de áreas de favelas ou de aglomerados residenciais sem condições de legalização dominial. Fala-se em áreas ocupadas por população de baixa renda, para sua moradia, sem que possam adquirir o imóvel por usucapião, haja vista que estará adquirida gleba em condomínio.
A usucapião familiar é uma modalidade de usucapião especial urbana, inserida no Código Civil, art. 1.240-A. É, portanto, instituída em favor de pessoas de baixa renda, que não têm imóvel próprio, seja urbano ou rural. Há algumas diferenças da usucapião especial urbana para a familiar, a primeira delas é que nesta última, a lei exige que o usucapiente seja coproprietário do imóvel, em comunhão com seu ex-cônjuge ou ex-companheiro. Ainda, é necessário que tenham abandonado o lar de forma voluntária e injustificada, e ainda, o prazo é menor, de apenas dois anos. Outra modalidade é a usucapião imobiliária, atualmente prevista na Lei nº 13.465/2017, é decorrente de legitimação da posse.
Cumpre salientar que essa modalidade surgiu com a Lei nº 11.977/2009 que criou o Programa “Minha Casa Minha Vida”. Essa modalidade de usucapião é requerida e processada no Cartório de Registro de Imóveis e não em juízo. Trata-se de um processo destinado à transformar a gleba em terra urbanizada com infraestrutura e integração à cidade.
A usucapião indígena vem tutelada no art. 33 da Lei nº 6.001/1973 Estatuto do Índio, que assim preceitua: O índio, integrado ou não, que ocupe como próprio, por dez anos consecutivos, trecho de terra inferior a cinquenta hectares, adquirir-lhe-á a propriedade plena. Isso significa que o beneficiário é o indígena integrado ou não integrado à civilização. A área que poderá ser usucapida será apenas a rural e particular, visto que o texto constitucional proíbe usucapião de bens públicos, dessa maneira, as áreas ocupadas pelos silvícolas são bens públicos federais, logo, inatingíveis e não podem ser usucapidas.
Por fim, tem-se a usucapião extrajudicial, introduzida pelo atual Código de Processo Civil na Lei nº 6.015/73 (Lei de Registros Públicos). Essa usucapião é processada diretamente no Cartório de Registro de Imóveis da comarca do imóvel.
Núcleo Científico Interno - (NCI)
Ma. Andreza da Silva Jacobsen
Esp. Edmundo Rafael Gaievski Junior
REFERÊNCIAS
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