Os benefícios das Ferramentas de Diálogo aplicadas na Mediação da Área da Saúde
- Andreza Jacobsen
- 28 de nov. de 2024
- 7 min de leitura
A mediação tem se consolidado como uma ferramenta eficaz para a resolução de conflitos em diversas áreas do direito, especialmente na saúde, onde a relação entre profissionais, pacientes e familiares é frequentemente marcada por tensões, equívocos e disputas. A utilização de ferramentas de diálogo no processo de mediação oferece uma abordagem inovadora para lidar com os conflitos de maneira mais humanizada e eficiente, promovendo a comunicação e a compreensão mútua entre as partes envolvidas. No contexto da saúde, essas ferramentas podem ser decisivas para a melhoria da qualidade dos serviços, a satisfação dos pacientes e a redução de litígios judiciais.
A mediação, como método alternativo de resolução de disputas, visa facilitar a comunicação entre as partes em conflito, com a ajuda de um terceiro imparcial — o mediador. No contexto da saúde, as disputas podem surgir entre pacientes e médicos, pacientes e operadoras de planos de saúde, familiares e equipes médicas, entre outros. Essas disputas podem envolver questões relacionadas a diagnósticos, tratamentos, custos de procedimentos, responsabilidades profissionais, direitos do paciente, entre outros aspectos.
Ao contrário de métodos adversariais, como o litígio judicial, a mediação busca promover o entendimento e a colaboração entre as partes, com o objetivo de alcançar soluções mutuamente aceitáveis. A aplicação de ferramentas de diálogo, como escuta ativa, reestruturação cognitiva e técnicas de comunicação não-violenta, torna o processo de mediação ainda mais eficaz, pois promove um ambiente seguro e acolhedor para que as partes se expressem e compreendam as perspectivas umas das outras.
Diversas ferramentas de diálogo podem ser aplicadas em processos de mediação, visando melhorar a comunicação e facilitar a resolução do conflito. Algumas das principais ferramentas incluem:
1. Escuta Ativa
A escuta ativa é uma técnica fundamental para estabelecer uma comunicação eficaz na mediação. Ela envolve ouvir atentamente o que a outra parte está dizendo, sem interrupções, com o intuito de compreender completamente suas preocupações e sentimentos. Essa técnica ajuda a construir confiança entre as partes e assegura que cada pessoa se sinta ouvida e valorizada, o que é essencial para a resolução do conflito. No contexto da saúde, a escuta ativa permite que médicos, pacientes e familiares expressem suas preocupações de maneira clara, enquanto o mediador ajuda a identificar pontos de consenso e divergência, facilitando um ambiente de colaboração.
2. Reformulação ou Parafraseamento
A reformulação ou parafraseamento é uma ferramenta que envolve repetir ou reestruturar as palavras do interlocutor, com o objetivo de garantir que o mediador compreendeu corretamente a mensagem. Esse processo também auxilia as partes a perceberem a situação sob uma nova perspectiva, evitando mal-entendidos e esclarecendo questões importantes.
Na área da saúde, onde a linguagem técnica pode gerar distorções, a reformulação é crucial para garantir que todos os envolvidos no processo compreendam claramente os pontos discutidos, evitando confusão e aumentando as chances de uma resolução satisfatória.
3. Comunicação Não-Violenta (CNV)
A Comunicação Não-Violenta é um modelo desenvolvido por Marshall Rosenberg que visa estabelecer uma comunicação empática e respeitosa, focada nas necessidades e sentimentos das partes envolvidas. Em vez de focar em acusações e julgamentos, a CNV ajuda a criar um diálogo construtivo, baseado em observações claras, sentimentos, necessidades e pedidos.
No setor da saúde, a CNV pode ser particularmente útil para lidar com situações de estresse ou frustração, como quando um paciente não está satisfeito com o atendimento recebido ou quando há divergências sobre as opções de tratamento. Ao aplicar a CNV, as partes são incentivadas a expressar suas necessidades de forma clara e a ouvir as necessidades dos outros, criando um ambiente mais harmonioso e colaborativo.
4) Rapport
O rapport se trata do vínculo de confiança que deve ser estabelecido entre o mediador e as partes, por meio do acolhimento dos problemas dessas, sempre com empatia e atenção. Essa técnica é necessária para que as partes possam se sentir confortáveis e confiantes de que estão em um ambiente de conversa seguro para expor suas considerações sobre o conflito. É importante que o mediador saiba aplicar essa técnica de forma igual e equilibrada entre as partes, para que não se torne um tratamento favorável a apenas uma delas. Na saúde, o estabelecimento de rapport pode melhorar a comunicação entre profissionais e pacientes, facilitando a compreensão mútua e a troca de informações relevantes. Isso é especialmente importante quando se trata de questões sensíveis, como doenças graves, tratamentos prolongados ou situações de estresse emocional, em que o paciente pode se sentir vulnerável ou ansioso. A relação deve resgatar conceitos como a escuta ativa, a empatia, o comportamento não verbal, comunicação clara e transparente, respeito e igualdade.
5) Caucus
Na mediação, também é possível realizar sessões com cada mediado individualmente, se necessário. Geralmente, essa técnica é aplicada quando as partes estão exaltadas e há dificuldade de manter uma conversa calma. Um exemplo é quando os mediados se interrompem a todo momento, impossibilitando que o outro conclua sua fala. Essa ferramenta pode ser muito interessante para que o mediador possa compreender as emoções de cada parte individualmente, analisar propostas e condições que são negociáveis e as não negociáveis. Da mesma forma, serve para, eventualmente, repreender uma parte sobre um comportamento que tenha atrapalhado o andamento da mediação e incentivá-la a tentar outro tipo de abordagem, dentre diversas outras finalidades. Vale ressaltar que o mediador só poderá compartilhar o que foi dito em uma sessão para outro mediado se houver a concordância expressa da parte que expôs a informação. Ainda é de extrema importância que o profissional conceda o mesmo tempo a cada parte nas sessões, sempre buscando manter a igualdade de tratamento. Entre as suas principais características estão: a) realização de reuniões privadas; b) estímulo à confiança entre as partes; c) estabelecimento de uma relação de proximidade. É importante ter cuidado, já que há controvérsia entre a utilização da caucus por alguns doutrinadores, tendo em vista que o fato de o mediador se reunir de forma privada com um dos envolvidos pode provocar certa desconfiança da outra parte. Por esse motivo, é fundamental ter um bom conhecimento e prática da estratégia para identificar o melhor momento de usá-la.
6. Tecnologias de Facilitação de Diálogo
Nos últimos anos, ferramentas tecnológicas, como plataformas de videoconferência e sistemas de mensagens seguras, também têm sido utilizadas para facilitar a mediação, especialmente em tempos de distanciamento social ou em áreas com pouca infraestrutura. Essas ferramentas permitem que mediadores conduzam sessões de mediação à distância, mantendo a qualidade do diálogo e a confidencialidade. Na área da saúde, a tecnologia pode ajudar a superar barreiras geográficas e logísticas, permitindo que pacientes, familiares e profissionais de saúde se conectem para discutir questões sensíveis de maneira eficiente, sem a necessidade de se deslocarem fisicamente.
Os benefícios da Aplicação das Ferramentas de Diálogo na Mediação para a Saúde:
1. Redução de Conflitos e Estresse: A mediação, ao proporcionar um ambiente de diálogo aberto e respeitoso, ajuda a reduzir o estresse emocional e os conflitos entre as partes. Pacientes e profissionais de saúde, quando ouvidos de forma atenta e empática, tendem a se sentir mais seguros e respeitados, o que pode diminuir a tensão que, muitas vezes, permeia as relações na área da saúde. Ao utilizar ferramentas como escuta ativa e CNV, as partes têm a oportunidade de expressar seus sentimentos de forma clara e sem julgamentos, o que pode resultar em uma resolução mais rápida e satisfatória dos conflitos;
2. Aprimoramento da Qualidade do Atendimento ao Paciente: Quando os conflitos entre pacientes e equipes médicas são resolvidos de maneira eficiente e colaborativa, a confiança mútua é restaurada. Isso resulta em uma relação mais saudável entre pacientes e profissionais de saúde, o que pode contribuir para a adesão ao tratamento e uma melhoria na qualidade do atendimento. Além disso, a utilização de ferramentas de diálogo ajuda a alinhar as expectativas das partes envolvidas, evitando frustrações e melhorando a comunicação sobre os tratamentos propostos, riscos e resultados esperados;
3. Economia de Tempo e Recursos: Ao resolver os conflitos de maneira consensual e sem recorrer a longos processos judiciais ou administrativos, a mediação permite uma economia significativa de tempo e recursos para as instituições de saúde. Isso libera tempo e recursos para a prestação de cuidados de saúde efetivos, ao mesmo tempo em que reduz os custos associados a litígios e processos judiciais;
4. Fortalecimento das Relações Interpessoais: A mediação fortalece as relações interpessoais dentro do ambiente de saúde, seja entre médicos e pacientes, seja entre a equipe de saúde e a administração hospitalar. Ao promover o entendimento mútuo e a colaboração, a mediação cria um ambiente mais harmonioso, onde a comunicação flui de forma mais eficiente e as soluções são baseadas em consenso, o que é crucial para a prestação de cuidados de saúde de qualidade.
As ferramentas de diálogo aplicadas na mediação oferecem um conjunto poderoso de recursos para resolver conflitos na área da saúde de maneira eficaz, humana e eficiente. Ao promover uma comunicação aberta, empática e respeitosa, essas ferramentas ajudam a reduzir tensões, melhorar a qualidade do atendimento e fortalecer as relações interpessoais entre pacientes, profissionais de saúde e gestores. A adoção da mediação e suas ferramentas de diálogo, portanto, não só contribui para a melhoria dos processos de resolução de conflitos, mas também para a construção de um ambiente de saúde mais cooperativo, ético e centrado no paciente.
Como processo que permite às pessoas envolvidas um novo olhar sobre o outro e sobre os vínculos que com ele mantêm, a mediação possibilita a ampliação da perspectiva e do agir também quanto à assistência e à clínica, reconhecendo-se a complexidade do outro e suas reais necessidades, sobretudo em relação ao paciente, favorecendo a instituição de equipes multiprofissionais e transdisciplinares e a ação conjunta e protagonista dos sujeitos implicados no processo de produção de saúde (profissionais e usuários).
A qualificação do diálogo e da relação pela mediação, tanto entre os profissionais de saúde envolvidos no tratamento, quanto destes com o paciente e sua família, possibilita decisões compartilhadas e compromissadas com a autonomia e a saúde dos usuários do serviço de saúde, com o direito à saúde em sentido ampliado e com as garantias asseguradas pela política de saúde.
Portanto, a busca por uma prestação do serviço de saúde que esteja comprometida com questões que ultrapassam as enfermidades físicas importa em diligenciar por uma abordagem adequada das relações e dos eventuais conflitos no âmbito da saúde. A mediação se apresenta como um instrumento de auxílio nesta prática da saúde, que prioriza o indivíduo e a qualidade das relações, uma vez que estimula a participação ativa, a consciência da realidade, o reconhecimento do outro e a atuação cooperativa. Nessa conjuntura, as pessoas envolvidas podem criar, fortalecer e manter vínculos e confiança, a despeito de eventuais situações adversas.
Núcleo Científico Interno (NCI)
Dra. Andreza da Silva Jacobsen
Dr. Edmundo Rafael Gaievski Junior.
REFERÊNCIAS
SOUZA, Cibele Aimé de. Mediação na saúde: parâmetros e adequações. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, 2021. Disponível em: https://www.tjmg.jus.br/portal-tjmg/. Acesso em: 28 nov. 2024.
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