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Instauração de Sindicância Médica vs. Processo Ético-Profissional: Entendendo as Diferenças e Implicações

  • Foto do escritor: Andreza  Jacobsen
    Andreza Jacobsen
  • 19 de nov. de 2024
  • 6 min de leitura

A atuação dos médicos está regulada por normas éticas e legais que visam garantir a qualidade do atendimento à saúde e a proteção dos pacientes. Quando um profissional da área da saúde comete condutas que podem ser consideradas irregulares ou incompatíveis com os padrões exigidos pela profissão, podem ser instaurados processos para apuração desses atos. Duas dessas formas de apuração são a sindicância médica e o processo ético-profissional. Embora ambas envolvam a investigação da conduta de um médico, elas possuem características distintas em termos de procedimento, objetivos e consequências. Mas, o que é uma Sindicância Médica? A sindicância médica é um procedimento preliminar que visa apurar a existência de infrações éticas ou legais cometidas por um profissional de saúde. Esse processo tem caráter investigativo e tem como objetivo reunir elementos que possam indicar a prática de infrações que justifiquem a instauração de um processo ético-profissional ou outras medidas cabíveis.


A sindicância é realizada por uma comissão, geralmente composta por médicos designados pelo Conselho Regional de Medicina (CRM) ou, em alguns casos, pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), que avaliam as denúncias e buscam esclarecer os fatos de forma rápida e preliminar. As principais características da sindicância médica são: a) Caráter investigativo: A sindicância não visa aplicar penalidades imediatas, mas sim investigar a veracidade de uma denúncia ou a ocorrência de uma suposta infração ética; b) Rápida apuração: A sindicância tende a ser mais célere do que um processo ético, com prazos mais curtos para a conclusão da apuração dos fatos; c) Procedimento preliminar: A sindicância pode resultar em uma série de desfechos, como o arquivamento da denúncia, o encaminhamento do caso para um processo ético, ou até a aplicação de medidas corretivas de caráter educativo; d) Sigilo: Durante a sindicância, as informações são tratadas de maneira sigilosa, a fim de proteger tanto o denunciante quanto o profissional investigado. A sindicância, portanto, atua como uma etapa inicial e preliminar para verificar se há elementos suficientes para a abertura de um processo ético ou para outras providências. O renomado professor Genivaldo Veloso de França, em sua obra atemporal, explica que a sindicância deve sempre preceder o processo ético-profissional, além de poder conter vícios que causem nulidade processual, conforme Genival Veloso de França, 2010, p. 15-22:

"O processo deve ser sempre precedido de sindicância, existam ou não elementos suficientes para se concluir pela existência de uma falta ou de sua autoria. Isto é claro, evitará a instauração de processos disciplinares com simples acusações ou presunções, carentes de provas e de argumentos convincentes. […] apesar da sua informalidade e do seu rito sumário, a sindicância não pode conter vícios ou omissões que eivem de nulidade este procedimento, desde que, é claro, resultem prejuízos irreparáveis ao sindicado."


Dessa forma, mesmo que não haja previsão de ampla defesa e contraditório nesta fase, poder-se-á verificar nulidade, tendo em vista a seletiva falta de oportunidade de manifestação dos médicos, além de criar evidente assimetria entre os envolvidos, causando evidente prejuízo àqueles cuja manifestação não foi oportunizada. No entanto, ainda mais importante é verificar que não há no Código de Processo Ético-Profissional, a hipótese de abertura de processo ético-profissional sem prévia instauração de sindicância contra os médicos denunciados. 


Com relação à fase do processo ético-profissional é uma etapa mais formal e detalhada, onde são apuradas as infrações mais graves ou as condutas que, caso comprovadas, resultariam em sanções disciplinares ao médico. Este processo ocorre após a conclusão da sindicância e, se necessário, é instaurado para assegurar que o profissional será julgado de acordo com o Código de Ética Médica e as normas estabelecidas pelos conselhos de classe.


Diferentemente da sindicância, o processo ético-profissional é um procedimento mais formal e punitivo, com direitos de defesa e contraditório garantidos ao médico acusado, conforme preceitos constitucionais. As principais características do processo ético-profissional são: a) Natureza punitiva: O principal objetivo do processo ético-profissional é apurar se o médico cometeu infrações graves e, caso a infração seja comprovada, aplicar a penalidade cabível, que pode variar desde uma advertência até a cassação do registro profissional; b) Garantia de defesa: Durante o processo ético, o médico tem o direito de se defender, apresentar provas e contestar as acusações. É garantido o direito ao contraditório e à ampla defesa, o que torna o processo mais formal e estruturado; c) Etapas mais detalhadas: O processo ético envolve uma análise mais aprofundada dos fatos, com depoimentos, provas documentais, pareceres técnicos e outras etapas que buscam garantir uma apuração completa e justa; d) Possibilidade de penalidades: Se a infração for confirmada, o médico pode ser penalizado com sanções que variam desde a advertência ou censura até a suspensão do exercício profissional ou a cassação do registro profissional; e) Transparência e publicidade: Diferente da sindicância, que é mais sigilosa, o processo ético-profissional é publicamente divulgado, especialmente em caso de penalidades mais severas.


Esse processo é conduzido por uma comissão de ética ou por um tribunal de ética, dependendo da gravidade da infração. Os conselhos de medicina, em suas diferentes esferas (regional ou federal), têm o papel de supervisionar, investigar e julgar as condutas dos médicos. Embora tanto a sindicância quanto o processo ético-profissional visem à apuração de irregularidades na conduta médica, existem algumas diferenças fundamentais entre eles:


  •  Objetivos: a) A sindicância tem como objetivo apurar preliminarmente se houve infração e se há elementos suficientes para justificar a abertura de um processo ético; b) O processo ético-profissional visa julgar a infração em si, com a possibilidade de aplicar sanções; 

  • Caráter: a) A sindicância é um procedimento investigativo e preliminar, que pode resultar em arquivamento ou encaminhamento para um processo ético; b) O processo ético é mais formal, estruturado e pode resultar em punições disciplinares, conforme a gravidade da infração; 

  • Consequências: a) A sindicância pode não resultar em penalidades, mas tem o papel de esclarecer os fatos de forma rápida; b) O processo ético pode resultar em penas severas, como a suspensão ou a cassação do registro profissional, caso a infração seja comprovada; 

  • Prazos e Formalidades: a) A sindicância geralmente é mais rápida e menos formal, com prazos curtos e uma investigação simplificada; b) O processo ético-profissional é mais demorado e detalhado, com maior formalidade e a garantia de um julgamento justo; 

  • Sigilo e Publicidade: a) Durante a sindicância, o sigilo é mantido para proteger todas as partes envolvidas; b) No processo ético a publicidade das decisões é garantida, especialmente se houver sanções aplicadas.


Mas, quando a sindicância conduz ao processo ético? Nem todas as sindicâncias resultam em processos éticos. Caso, após a apuração, a comissão responsável pela sindicância entenda que as evidências não são suficientes ou que a infração não é grave o suficiente, o caso pode ser arquivado ou resolvido com uma medida corretiva mais leve, como uma orientação ao médico sobre condutas éticas. No entanto, quando a sindicância identifica indícios claros de violação ética significativa ou que impactam diretamente na segurança do paciente, a comissão pode encaminhar o caso para um processo ético, onde o médico será formalmente acusado e terá a oportunidade de se defender antes da decisão final.


A sindicância médica e o processo ético-profissional são instrumentos essenciais para assegurar a qualidade da medicina e a proteção dos pacientes. Enquanto a sindicância serve como um procedimento preliminar para investigar denúncias e determinar a necessidade de um julgamento mais formal, o processo ético-profissional é a fase em que o médico pode ser efetivamente julgado e penalizado por infrações graves.


Portanto, se esclarece que a abertura de sindicância contra cada médico, de forma individualizada, é pressuposto necessário de validade do processo ético-profissional, porquanto necessária a observância do procedimento previsto no regramento próprio. Em conclusão, estabelece-se uma regra clara e direta: não deve haver abertura de processo ético-profissional contra médico que não tenha sido objeto de instauração de sindicância médica. 


Logo, no caso concreto citado, verificando a possibilidade de infração ética por médicos diversos daqueles já denunciados, deve haver instauração de ofício de nova sindicância, com possibilidade de manifestação escrita, garantindo a paridade de defesa entre todos os envolvidos. Entender as diferenças entre esses dois mecanismos é crucial para os profissionais da saúde, que devem estar cientes de seus direitos e deveres, e para a sociedade, que espera que os médicos cumpram com elevados padrões de ética e responsabilidade profissional.



Núcleo Científico Interno - (NCI)


Dra. Andreza da Silva Jacobsen

Dr. Edmundo Rafael Gaievski Junior 



REFERÊNCIAS 


MOSSIMANN, Francisco Norival. Instauração de sindicância médica previamente ao processo ético-profissional. Conjur, 2023. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2023-jun-30/francisco-mosimann-obrigacao-instauracao-sindicancia-medica2/#:~:text=A%20sindic%C3%A2ncia%20m%C3%A9dica%20%C3%A9%20uma,%C3%A9tica%20por%20parte%20do%20m%C3%A9dico.


FRANÇA, Genival Veloso de. Comentários ao Código de Processo Ético-Profissional dos Conselhos de Medicina do Brasil. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 15-22, grifos nossos.

 
 
 

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