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Guarda conferida a terceiros e a compatibilidade com o Direito de visitas e o dever de prestar alimentos dos pais naturais

  • Foto do escritor: Andreza  Jacobsen
    Andreza Jacobsen
  • 18 de nov. de 2024
  • 5 min de leitura

No âmbito do direito de família, as questões relacionadas à guarda dos filhos são frequentemente debatidas, especialmente quando se envolve a possibilidade de a guarda ser conferida a terceiros que não os pais biológicos. A guarda de crianças por terceiros, que pode ocorrer por diversos motivos, como incapacidade dos pais ou situações de risco à criança, levanta diversas questões jurídicas, incluindo a compatibilidade com os direitos dos pais biológicos, como o direito de visitas e o dever de prestar alimentos.


Para tanto, é essencial entender a fundamentação jurídica sobre esse tipo de  guarda e as consequências dessa decisão para os envolvidos. A guarda é o instituto jurídico que confere a uma pessoa ou entidade a responsabilidade legal de cuidar e tomar decisões sobre a vida de um menor. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 227, estabelece que os direitos da criança e do adolescente devem ser assegurados, incluindo o direito à convivência familiar e comunitária. O Código Civil, por sua vez, detalha os aspectos legais da guarda, incluindo os tipos de guarda possíveis e as circunstâncias que envolvem sua concessão.


Existem três tipos principais de guarda no direito brasileiro:


  1. Guarda unilateral: Quando a guarda é atribuída a um dos pais, enquanto o outro, embora não tenha a guarda, mantém o direito de visitas e, em alguns casos, o dever de prestar alimentos.

  2. Guarda compartilhada: Em que ambos os pais dividem as responsabilidades sobre a criança, mantendo um vínculo próximo e equilibrado, com a possibilidade de tomar decisões de forma conjunta.

  3. Guarda por terceiros: Quando, por motivos diversos, a criança é entregue a um terceiro, que pode ser um parente ou outra pessoa considerada apta a assumir a responsabilidade pela criança. A guarda por terceiros pode ser decidida em situações de incapacidade dos pais biológicos, como em casos de abuso, negligência, ou impossibilidade de cuidar do filho devido a questões de saúde, vícios ou outra condição que comprometa o bem-estar da criança.


A guarda de uma criança por terceiros geralmente ocorre em situações excepcionais, quando a convivência com os pais não é mais viável ou segura. O juiz, ao decidir sobre a guarda, leva em consideração o melhor interesse da criança, buscando garantir sua proteção, educação e bem-estar. A guarda de terceiros pode ser solicitada por familiares, como avós, tios ou até outros membros da família ampliada. Contudo, a decisão de conceder a guarda a terceiros não retira, automaticamente, o direito dos pais biológicos sobre a criança. Em outras palavras, mesmo que a guarda seja atribuída a um terceiro, os pais naturais ainda têm direitos e deveres, especialmente no que se refere ao direito de visitas e ao dever de prestar alimentos.


A convivência familiar é um direito fundamental da criança, conforme o artigo 227 da Constituição Federal, que estabelece a proteção da criança ao convívio familiar. Mesmo que a guarda de um filho seja transferida a terceiros, isso não significa que o direito de convivência com os pais biológicos seja extinto.


O direito de visitas é uma forma de assegurar a continuidade do vínculo afetivo entre os pais e os filhos, mesmo quando a guarda não é compartilhada. Esse direito é garantido pelo Código Civil e, em especial, pela Lei nº 13.058/2014, que regula a guarda compartilhada. Quando a guarda é atribuída a terceiros, os pais, especialmente o genitor que não tem a guarda, continuam com o direito de estabelecer períodos de convivência com o filho, a menos que haja motivos graves para a suspensão desse direito, como situações de violência ou risco à integridade da criança.


O juiz, ao estabelecer o regime de visitas, deve sempre considerar o melhor interesse da criança. Se o convívio com os pais for saudável e contribuir para o desenvolvimento da criança, o direito de visitas deverá ser assegurado, respeitando as condições do terceiro que tem a guarda. Se necessário, esse direito pode ser regulamentado de maneira mais restritiva, como visitas supervisionadas, caso a situação envolva fatores de risco.


O dever de prestar alimentos, conforme o artigo 1.694 do Código Civil, é um dever que persiste, independentemente da guarda. Mesmo que a guarda seja atribuída a terceiros, os pais biológicos não perdem a obrigação de garantir a subsistência do filho, principalmente quando ele não tem capacidade de se manter por conta própria. A pensão alimentícia, estabelecida judicialmente, deve ser paga pelos pais de acordo com suas possibilidades financeiras e as necessidades do filho.


Esse dever de alimentos está diretamente ligado ao direito da criança à educação, saúde, alimentação e bem-estar. O fato de a criança viver sob a guarda de terceiros não exime os pais naturais de sua responsabilidade de prover o sustento da criança. O juiz pode determinar, caso necessário, o valor da pensão alimentícia, levando em consideração a capacidade financeira dos pais e a necessidade da criança, como se fosse uma obrigação direta, mesmo sem o convívio diário.


Vale ressaltar que o valor da pensão alimentícia pode ser revisto ao longo do tempo, com base nas mudanças das condições dos pais e das necessidades da criança. Caso os pais deixem de cumprir sua obrigação alimentar, podem ser alvo de ações judiciais e sofrer as consequências legais previstas, como penhora de bens e até prisão civil, em casos de inadimplência.


A concessão da guarda a terceiros, por si só, não anula os direitos dos pais biológicos de manterem um vínculo com a criança nem a obrigação de prestar alimentos. Esses direitos e deveres são independentes e continuam a existir, mesmo que a criança esteja sob a responsabilidade de outra pessoa. Desse modo, se define abaixo quais os direitos e deveres em relação aos filhos:


  1. Direito de Visitas: O direito de convivência dos pais com o filho deve ser preservado, salvo se houver riscos à integridade da criança. Mesmo quando a guarda é atribuída a terceiros, os pais continuam com o direito de visitas, com a possibilidade de ajustá-lo ao melhor interesse da criança.

  2. Dever de Prestar Alimentos: O dever de prestação de alimentos permanece com os pais biológicos, independentemente de quem tenha a guarda da criança. A responsabilidade de sustentar o filho é permanente, devendo ser cumprida conforme as possibilidades financeiras dos pais.

  3. Atribuição de Guarda e a Autonomia dos Pais: Quando a guarda é atribuída a terceiros, isso não significa que os pais perdem o direito de exercer sua autoridade parental, salvo em casos excepcionais de perda do poder familiar. O direito de visitação e a responsabilidade de prestar alimentos são formas de assegurar que a criança continue a ter o apoio e os cuidados necessários para seu desenvolvimento saudável.


A guarda conferida a terceiros, por mais que seja uma medida excepcional, não deve afastar os direitos e deveres dos pais naturais em relação à criança. A legislação brasileira garante que, mesmo quando a criança está sob a guarda de terceiros, o direito de convivência familiar, por meio do direito de visitas, e o dever de prestar alimentos não se extinguem.


Todas essas medidas de proteção buscam assegurar o melhor interesse da criança, que deve ser sempre priorizado. A manutenção do vínculo com os pais e a contribuição financeira para seu sustento são direitos e deveres inalienáveis, que se adaptam à realidade de cada caso, sem prejuízo da proteção integral da criança. Portanto, a guarda por terceiros deve ser vista como uma forma de garantir o bem-estar da criança, mas, sempre em conformidade com os direitos fundamentais dos pais biológicos e da criança.


Núcleo Científico Interno - (NCI)


Dra. Andreza da Silva Jacobsen

Dr. Edmundo Rafael Gaievski Junior




REFERÊNCIAS



BRASIL. Lei nº 13.058 de 22 de dezembro de 2014. Altera os arts. 1.583, 1.584, 1.585 e 1.634 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), para estabelecer o significado da expressão “guarda compartilhada” e dispor sobre sua aplicação. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13058.htm. Acesso em: 13 nov. 2024.


ROSSATO, Luciano Alves; LÉPORE, Paulo Eduardo; CUNHA, Rogério Sanches. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei nº 8.069/90. 7 ed. rev. amp. São Paulo: Saraiva, 2015.

 
 
 

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