Direito à identidade e enfrentamento ao Sub-registro
- Andreza Jacobsen
- 28 de out. de 2024
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A Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) estabelece que toda pessoa tem direito à identidade. Nessa perspectiva, o Registro Civil de Nascimento é o direito de cada uma e de cada um a ter reconhecido o seu nome, sua genealogia, sua data e local de nascimento, sua identidade enquanto indivíduo e coletividade. A maior justificativa que se pode dar ao reconhecimento do direito à identidade pessoal no ordenamento brasileiro e sua perspectiva de integrar os direitos da personalidade reside, assim, no seu fundamento constitucional, isto é, na cláusula geral de tutela da pessoa humana em sua dignidade pessoal. Sendo assim, o compromisso nacional pela erradicação do sub-registro visa combater essa ocultação de identidade que apesar do tempo ainda persiste em solo brasileiro.
Com o Decreto 10.063 de 14 de outubro de 2019, o Compromisso Nacional pela Erradicação do Sub-registro Civil de Nascimento e Ampliação do Acesso à Documentação Básica objetiva conjugar esforços da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios para erradicar o sub-registro civil de nascimento no País e ampliar o acesso à documentação civil básica a todos os brasileiros. E qual a importância do combate ao Sub-registro? É a luta pelos direitos de milhares de brasileiros que ainda se encontram restritos em seu direito a identidade, pois sem a documentação devida, não alcançam os principais requisitos para o verdadeiro exercício da cidadania. O principal documento após o nascimento é o Registro Civil de Nascimento (RCN) que é uma anotação oficial do nascimento de uma pessoa, com ele há o reconhecimento legal da existência de um indivíduo, feito por um agente formalmente autorizado, onde se registra informações como seu nome, sexo, filiação, data, horário e local de nascimento.
Desde 2007, o Estado brasileiro assumiu o Compromisso Nacional pela erradicação do Sub-registro Civil de Nascimento e ampliação do acesso à documentação básica. A gestão governamental, a economia, a cultura, a segurança e a assistência social, dependem de informações básicas sobre a população para o planejamento das políticas que são a ela destinadas. Quanto mais precisas e qualificadas estas informações, mais eficaz e eficiente poderá ser a ação dos governos e agentes públicos. Por consequência disso a Lei dos Registros Públicos (6.015/1973) em seu art. 1º que:
Os serviços concernentes aos Registros Públicos, estabelecidos pela legislação civil para autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos, ficam sujeitos ao regime estabelecido nesta Lei.
§ 1º Os Registros referidos neste artigo são os seguintes:
I - o registro civil de pessoas naturais;
Ainda o artigo 50, da mesma lei declara que: “Todo nascimento que ocorrer no território nacional deverá ser dado a registro, no lugar em que tiver ocorrido o parto ou no lugar da residência dos pais, dentro do prazo de quinze dias, que será ampliado em até três meses para os lugares distantes mais de trinta quilômetros da sede do cartório. Ou seja, a luta contra o sub-registro é a possibilidade, é o abrir portas para que os cidadãos desde o nascimento sejam vistos pelo poder público, pois, é através dessa visibilidade que se fortalecem as políticas públicas em relação a população. Em relação ao direitos civis e políticos o registro civil de nascimento é o reconhecimento da existência de um indivíduo como parte de uma sociedade, sendo indispensável, para a emissão do título de eleitor, que garante o direito de votar e ser votado, de participar da vida política do país.
No que se refere a direitos sociais e culturais e econômicos é através do registro civil de nascimento que é possível acessar vários serviços públicos, como educação, saúde e assistência social. É um dos itens necessários para emitir um Cadastro de Pessoa Física (CPF) e uma Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS). Com esses documentos, é possível formalizar uma relação de emprego, tornar-se um microempreendedor, prestar serviços como autônomo, criar uma empresa ou abrir uma conta bancária. São também documentos imprescindíveis para garantir o direito à aposentadoria, para formalizar a matrícula em uma escola ou ser beneficiado por um programa de renda mínima, por exemplo. Já quanto a direitos transindividuais, o registro civil de nascimento se relaciona também com o exercício de direitos coletivos, como aqueles que regulam as relações de consumo, ou difusos, que dizem respeito à garantia das condições de existência humana.
As informações geradas pelos RCN (Registro Civil de Nascimento) são fundamentais para o planejamento urbano, para a regulação da atividade econômica, para a construção de um modelo de desenvolvimento sustentável que garanta, a cada um e a todos, uma existência positiva no mundo.
Dessa forma o direito à identidade, e a importância do registro civil e acesso a documentação básica é um amplo mecanismo para reformular todo o cenário nacional, pois, tratam-se de cidadãos que conseguem a visibilidade. Através desse formalização de documentação é possível que estas pessoas se matriculem em escolas, regularizem suas questões pessoais com a introdução da figura do pai em seus registros civis. Infelizmente, uma parcela significativa de cidadãos ainda não tem inserido o nome do pai em seus registros pela falta de reconhecimento de paternidade, mas, essa realidade pode ser alterada pela reestabelecimento de conexões entre pais e filhos. Todavia, essa prática se alcança mediante a formalização da documentação. O acesso, a reinserção, a conexão com a família, também é facilitado quando se há um registro civil, e além da documentação básica que proporciona o acesso à educação. Falar em direito a identidade, não dá respaldo somente ao indivíduo, mas, todas as consequências a partir de seu nascimento.
O viés jurídico luta constantemente para a melhoria do panorama da plano identitários das pessoas, pois, as inovações do legislador, se fazem necessárias para afronta das mazelas presentes na realidade brasileira. O decreto 10.063 de 2019 estimula as esferas nacional, estadual e municipal a combaterem o sub-registro, visto que, muitos problemas sociais ainda assolam o país, sendo o principal deles o direito de ver visível, de ter direitos, de conseguir ter a sua documentação. É uma legislação tardia, com base no histórico do país, mas, que abrange um fator extremamente básico e essencial que é o próprio direito à identidade.
Núcleo Científico Interno - (NCI)
Dra. Andreza da Silva Jacobsen
Dr. Edmundo Rafael Gaievski Junior
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 28 out. 2024.
BRASIL. Decreto nº 10.063, de 14 de outubro de 2019. Dispõe sobre o Compromisso Nacional pela Erradicação do Sub-registro Civil de Nascimento e Ampliação do Acesso à Documentação Básica, o Comitê Gestor Nacional do Compromisso Nacional pela Erradicação do Sub-registro Civil de Nascimento e Ampliação da Documentação Básica e a Semana Nacional de Mobilização para o Registro Civil de Nascimento e a Documentação Básica. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/decreto/d10063.htm. Acesso em: 28 out. 2024.
BRASIL. Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Dispõe sobre os registros públicos, e dá outras providências. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/CCivil_03/leis/L6015consolidado.htm. Acesso em: 28 out. 2024.
ESCOLA NACIONAL DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. Direito à Identidade, Cidadania e Documentação. Escola Virtual do Governo, 2024. Disponível em: https://mooc41.escolavirtual.gov.br/course/view.php?id=7463#section-5. Acesso em: 28 out. 2024.
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