Dano moral in re ipsa no Direito Civil brasileiro
- Andreza Jacobsen
- 7 de out. de 2024
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Via de regra geral de reparação de danos, em nosso ordenamento jurídico, quem ajuiza ação solicitando indenização ou reparação deve provar o prejuízo que sofreu. Entretanto, em algumas situações o dano moral pode ser presumido, ou conhecido como “in re ipsa”, expressão em latim utilizada pela linguagem jurídica. Nestes casos, diante do autor provar a prática do ato ilícito, o dano está configurado, não sendo necessário comprovar a violação dos direitos da personalidade, que seria uma lesão à sua imagem, honra subjetiva ou privacidade.
Um exemplo claro é a inscrição indevida de alguém em cadastro de restrição de crédito. É muito comum que empresas efetuem cobranças de valores que não são devidos e acabam por enviar o nome do cliente para o Serasa. Nesse caso o dano moral é presumido, ou seja a pessoa não precisa provar que passou vergonha ao solicitar um crédito ou ter a negativa pela restrição que consta em seu nome. Logo, basta que comprove que a cobrança não procede, pois a simples restrição indevida pela empresa já configura na ocorrência de um sofrimento moral.
Outro exemplo no qual a jurisprudência dos tribunais consideram um dano moral presumido é no overbooking, prática das empresas aéreas em vender mais passagens do que a capacidade da aeronave, ocasião na qual alguns passageiros ficam impossibilitados de viajar. Conforme a jurisprudência do Tribunal de Justiça do estado do Paraná preceitua:
Apelação: APL197928120178160014 Londrina-(Acórdão)- 11/02/2021.
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTOS INDEVIDOS INCIDENTES SOBRE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DE APOSENTADORIA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA, QUE AFASTOU A PRETENSÃO INDENIZATÓRIA EXTRAPATRIMONIAL. FRAUDE NA CONTRATAÇÃO. FALSIFICAÇÃO DE ASSINATURA COMPROVADA POR MEIO DE PERÍCIA PAPILOSCÓPICA. DESCONTO INDEVIDO SOBRE VERBA ALIMENTAR. DANO MORAL “IN RE IPSA” CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO ARBITRADO EM R$ 10.000,00 (DEZ MIL REAIS), DE ACORDO COM OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. CAPACIDADE ECONÔMICA DAS PARTES, EXTENSÃO DO DANO, CARÁTER PUNITIVO COMPENSATÓRIO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. INVERSÃO DOS ENCARGOS SUCUMBENCIAIS. PREQUESTIONAMENTO. OBSERVÂNCIA DO ART. 1.025 , CPC.RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJPR - 9ª C. Cível - 0019792-81.2017.8.16.0014 - Londrina - Rel.: DESEMBARGADOR ARQUELAU ARAUJO RIBAS - J. 30.01.2021).
Ou seja, conforme o exemplo acima, diante do prejuízo causado foi necessária a reforma da sentença. Outros casos que configuram como dano in re ipsa decididos pelo STJ são: equívocos administrativos, diplomas sem reconhecimento, responsabilidades bancárias, todas questões de que alguma forma causaram prejuízo aos cidadãos e que foram considerados não passíveis da necessidade de comprovação.
Ainda o STJ têm orientação firmada no sentido de que a recusa indevida de tratamento médico emergencial, pela operadora de plano de saúde, enseja reparação por danos morais, pois, agrava a situação de aflição psicológica e de angústia do beneficiário, estando caracterizado o dano moral in re ipsa.
Em 2017, no REsp 1.642.318, a Terceira Turma estabeleceu que o reconhecimento do dano moral sofrido por criança vítima de agressão não exige o reexame de provas do processo – o que seria inviável na discussão de recurso especial –, sendo suficiente a demonstração de que o fato ocorreu. Os ministros rejeitaram o recurso especial de uma mulher condenada a pagar R$ 4 mil por danos morais em razão de agressões verbais e físicas contra uma criança de dez anos que havia brigado com sua filha na escola.
Para a relatora, ministra Nancy Andrighi, "a sensibilidade ético-social do homem comum, na hipótese, permite concluir que os sentimentos de inferioridade, dor e submissão sofridos por quem é agredido injustamente, verbal ou fisicamente, são elementos caracterizadores da espécie do dano moral in re ipsa”.
Núcleo Científico Interno - (NCI)
Dra. Andreza Jacobsen
Dr. Edmundo Rafael Gaievski Junior
REFERÊNCIAS
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. In re ipsa: os entendimentos mais recentes do STJ sobre a configuração do dano presumido. Brasília, DF: Superior Tribunal de Justiça, 2022. Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2022/11092022-In-re-ipsa-os-entendimentos-mais-recentes-do-STJ-sobre-a-configuracao-do-dano-presumido.aspx. Acesso em: 04 out. 2024.
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