Dados Genéticos e Investigação Criminal: novas nuances, novos desafios.
- Andreza Jacobsen
- 13 de jan.
- 5 min de leitura
A utilização de dados genéticos na investigação criminal é um avanço significativo da ciência forense, revolucionando a forma como as autoridades conduzem investigações, identificam criminosos e solucionam crimes. O DNA (ácido desoxirribonucleico), presente em todas as células do corpo humano, é único para cada indivíduo (exceto em casos de gêmeos idênticos), o que o torna uma ferramenta poderosa e confiável no processo de identificação. A seguir, uma análise detalhada sobre o uso de dados genéticos na investigação criminal.
Os dados genéticos têm se tornado um dos pilares das investigações criminais devido à sua capacidade de fornecer provas irrefutáveis sobre a identidade de uma pessoa envolvida em um crime. O DNA pode ser coletado de diversas fontes, como sangue, saliva, cabelo, pele e até vestígios em cenas de crime (por exemplo, em objetos manipulados pelo criminoso). O principal benefício do uso do DNA é a sua unicidade: cada indivíduo possui um perfil genético único (exceto os gêmeos idênticos), o que torna a comparação entre amostras altamente precisa.
Em termos forenses, o uso de dados genéticos serve para:
Identificação de suspeitos e vítimas: O DNA encontrado no local do crime pode ser comparado com o perfil genético de suspeitos ou de um banco de dados criminal.
Relações de parentesco: Quando uma identificação direta não é possível, testes genéticos podem ser usados para determinar relações de parentesco, como paternidade ou identidade de familiares, o que é crucial em casos de desaparecimentos.
Exclusão de inocentes: O uso do DNA pode não apenas identificar o culpado, mas também excluir pessoas que inicialmente eram suspeitas, evitando que indivíduos inocentes sejam erroneamente processados.
O processo de coleta de dados genéticos em investigações criminais envolve etapas rigorosas para garantir a integridade das amostras e a validade das evidências. O procedimento envolve:
Coleta de amostras: O material genético pode ser coletado de diversos lugares, como da cena do crime, da vítima, de roupas, objetos ou até de fluidos corporais deixados durante o crime. As amostras devem ser manipuladas com extrema cautela para evitar contaminação.
Extração do DNA: A partir da amostra coletada, o DNA é extraído. Essa etapa envolve a quebra das células para liberar o material genético.
Amplificação do DNA: Devido à quantidade muitas vezes pequena de DNA disponível nas amostras coletadas, técnicas como a Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) são utilizadas para amplificar (replicar) as regiões específicas do DNA, tornando-as detectáveis.
Análise e Comparação: O DNA amplificado é analisado em busca de marcadores genéticos específicos, que são sequências de bases no DNA que variam de pessoa para pessoa. O perfil gerado é comparado com o banco de dados criminal ou com o DNA de suspeitos.
A utilização de bancos de dados genéticos é um componente primordial na investigação criminal moderna. Estes bancos contêm perfis de DNA de pessoas envolvidas em investigações criminais, condenados, suspeitos, vítimas e até de pessoas encontradas em cenas de crime. As principais funcionalidades dos bancos de dados incluem:
Identificação de suspeitos e vínculos entre crimes: Quando o DNA encontrado em uma cena de crime é analisado, ele pode ser comparado com perfis armazenados em bancos de dados para identificar criminosos conhecidos ou até vincular um crime a outros não resolvidos.
Resolução de casos antigos ("casos frios"): Muitos crimes, especialmente homicídios e abusos, ficam sem solução por anos. Com o tempo, o avanço da genética forense e a criação de novos bancos de dados permitem que perfis antigos de DNA sejam analisados novamente, o que pode levar à identificação do criminoso.
Ampliação de bancos de dados: Cada vez mais países estão expandindo seus bancos de dados genéticos, o que inclui não apenas criminosos já identificados, mas também pessoas que voluntariamente fornecem seu DNA, como no caso de investigações de desaparecimentos ou investigações em série.
A utilização de dados genéticos tem sido fundamental na resolução de casos históricos que antes seriam considerados difíceis ou até impossíveis de resolver. Exemplos incluem:
O caso de "Golden State Killer" (Assassino do Estado Dourado): Um dos exemplos mais notórios de uso de DNA na investigação criminal é o caso do "Golden State Killer", que cometeu uma série de crimes nos Estados Unidos nas décadas de 1970 e 1980. O caso foi resolvido em 2018 graças à utilização de genealogia genética, quando o perfil genético do criminoso foi encontrado em um banco de dados de genealogia, ligado a familiares que haviam se registrado voluntariamente para fins de teste de paternidade e ancestralidade.
Casos de "DNA descartado": Em várias investigações, a polícia tem encontrado amostras de DNA descartadas de criminosos, como em objetos de uso pessoal ou até mesmo em lixo, que levam à identificação de indivíduos envolvidos em crimes.
Apesar dos avanços, o uso de dados genéticos na investigação criminal também levanta questões éticas e legais significativas, que precisam ser abordadas para garantir que o processo seja justo e respeite os direitos individuais. Alguns dos principais desafios incluem:
Privacidade e Consentimento: A coleta de DNA sem o consentimento explícito de um indivíduo pode ser vista como uma violação de privacidade. Além disso, o uso de bancos de dados de genealogia online sem o consentimento direto do indivíduo para fins criminais pode gerar preocupações sobre a extensão do uso dos dados genéticos.
Falsos Positivos e Erros Laboratoriais: Embora a análise genética seja altamente precisa, erros laboratoriais, como a contaminação das amostras ou falhas na amplificação do DNA, podem resultar em falsos positivos, levando à acusação errada de um inocente.
Discriminação Genética: Existe o risco de que dados genéticos possam ser usados para discriminar indivíduos, seja em contextos jurídicos ou outros, como em seguros ou emprego, uma vez que informações genéticas podem revelar predisposições a doenças ou características pessoais.
O futuro do uso de dados genéticos na investigação criminal é promissor. Com os avanços contínuos nas tecnologias de sequenciamento de DNA e a crescente acessibilidade a ferramentas de análise genética, a capacidade de identificar criminosos e resolver casos antigos deve melhorar ainda mais. Espera-se que a colaboração internacional entre bancos de dados e o uso de inteligência artificial para analisar grandes volumes de dados genéticos possa acelerar a resolução de crimes e fornecer uma base sólida para a justiça criminal.
Entretanto, é essencial que as políticas públicas e as leis evoluam para garantir que os direitos de privacidade e as liberdades individuais sejam preservados, estabelecendo limites claros para o uso de dados genéticos, ao mesmo tempo em que se aproveitam os benefícios dessa tecnologia para a segurança pública.
A utilização de dados genéticos na investigação criminal representa uma das inovações mais transformadoras da criminologia moderna. Ao oferecer uma ferramenta de identificação precisa, é possível resolver crimes que de outra forma poderiam permanecer sem solução.Todavia, com seu poder vêm responsabilidades, e o uso de dados genéticos deve ser regulamentado de forma cuidadosa para evitar abusos e proteger a privacidade dos indivíduos. A continuidade do desenvolvimento ético e científico nesta área será crucial para garantir que a justiça seja feita de maneira equitativa e eficaz.
Núcleo Científico Interno (NCI)
Dra. Andreza da Silva Jacobsen
Dr. Edmundo Rafael Gaievski Junior
REFERÊNCIAS
DAL SOCHIO, Roberta Oliveira. Genealogia genética, proteção de dados genéticos e investigação criminal. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais Aplicadas - Direito), Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2022. Disponível em: https://bdtd.ibict.br/vufind/Record/P_RS_74a152615ef836e05af5f987110267fe. Acesso em: 13 jan. 2024.
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