top of page

Da solidariedade familiar

  • Foto do escritor: Andreza  Jacobsen
    Andreza Jacobsen
  • 18 de out. de 2024
  • 6 min de leitura

O princípio da solidariedade tem seu surgimento desde a época dos grandes filósofos da antiguidade da Grécia e consiste em uma forma de unir não só as pessoas entre si, mas também a sociedade, em um sentimento de fazer o bem ao próximo. Neste sentido, Venosa (2008, p. 2) traz a visão de que temos a família vista sob o conceito sociológico, que basicamente é formada pelas pessoas que habitam o mesmo teto, obedecendo a autoridade de um titular. Mas as noções atuais de família nas civilizações ocidentais cada vez mais se afastam daquela ideia inicial de poder e coloca como principal objetivo a vontade de seus membros, igualando assim os direitos e deveres familiares. 


A lei deve ter como objeto a facilitação, através de todos os meios justos e legais, o enquadramento nela de qualquer tipo de convivência com cunho familiar, para que seja reconhecida como união oficial e que tenha reconhecimento pelo Estado, pois a dignidade dela não deve estar restrita ao formalismo anterior, mas ao sentimento de amor, respeito mútuo e responsabilidade que une os casais (AZEVEDO, 2002, p.24). Contudo, observamos os novos modelos familiares estruturados nas relações de afeto, carinho, realização pessoal e claramente conseguimos observar a concretização da realização do princípio da solidariedade nestas novas famílias. Solidariedade é o que cada um deve ao outro. Esse princípio, baseado em vínculos afetivos, dispõe de acentuado conteúdo ético, pois detém em suas entranhas o próprio significado da expressão solidariedade, que compreende a fraternidade e a reciprocidade. A pessoa só existe enquanto coexiste. 


O princípio da solidariedade tem previsão constitucional, tanto que seu preâmbulo assegura uma sociedade fraterna. Uma das formas originárias de proteção social que até hoje se mantém é a família. A lei se aproveita da solidariedade que existe no âmbito das relações familiares. Ao gerar deveres recíprocos entre os integrantes do grupo familiar, garante que é atribuído primeiro à família, depois à sociedade e finalmente ao Estado o dever de garantir com absoluta prioridade os direitos inerentes aos cidadãos. Impor aos pais o dever de assistência aos filhos decorre do princípio da solidariedade. Em semelhante caso deve ocorrer o amparo às pessoas idosas. Conforme o que expõe o Código Civil em seu art. 229 "Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade. Além disso o artigo 230 também reforça o argumento que: "A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida.


A lei civil igualmente consagra o princípio da solidariedade ao prever que o casamento estabelece plena comunhão de vida segundo o art. 1.511 "O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges". A obrigação alimentar também compõe o critério da solidariedade dispondo de conteúdo fundamentado acerca do assunto no âmbito civil: 


Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.

§ 1 Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.

§ 2 Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia.


Nesse caso tratando-se de alimentos os integrantes da família são, em regra, reciprocamente credores e devedores uns dos outros. A imposição de tal obrigação entre parentes representa a concretização do princípio da solidariedade familiar. Acerca dos alimentos compensatórios a justificativa está pautada no dever de assistência, nada mais do que a consagração do princípio da solidariedade. Se configuram como requisitos do princípio da solidariedade: a) As Responsabilidades Mútuas: Discuta como a solidariedade se manifesta em obrigações como pensão alimentícia, cuidado dos filhos e apoio emocional; b) A Solidariedade em Situações de Crise: abordando como a solidariedade é essencial em situações como divórcios, separações e falecimentos; c) a Coesão Social: aqui a solidariedade contribui para a construção de laços sociais e a harmonia nas comunidades; d) Justiça e Igualdade: neste sentido a solidariedade está ligada à busca por justiça social, apoiando os mais vulneráveis e promovendo a equidade; e) Solidariedade na Ética e Moral: nesse ponto a solidariedade se relaciona com valores éticos e morais, como empatia e responsabilidade social.


Há que se considerar as visões opostas ou críticas, como a possibilidade de abuso da solidariedade em situações de desentendimentos familiares. Todavia a maior importância da solidariedade é o fortalecimento das relações familiares e da promoção do bem-estar dos membros da família, pois, se relaciona com valores éticos. Conforme as palavras de Paulo Lioz Netto Lôbo (2007):


Há solidariedade quando há afeto, cooperação, respeito, assistência, amparo, ajuda, cuidado; o direito os traz a seu plano, convertendo-os de fatos psicológicos ou anímicos em categorias jurídicas, para iluminar a regulação das condutas. Cada uma dessas expressões de solidariedade surge espontaneamente, nas relações sociais, como sentimento. Mas o direito não lida com sentimentos e sim com condutas verificáveis, que ele seleciona para normatizar. Assim, o princípio da solidariedade recebe-os como valores e os transforma em direitos e deveres exigíveis nas relações familiares. Por exemplo, o Estatuto do Idoso transformou o dever apenas moral de amparo dos idosos em dever jurídico; ou seja, o sentimento social de amparo migrou para o direito, concretizando o princípio da solidariedade. Mas, ainda quando a lei seja omissa, o juiz deve aplicar diretamente o princípio.


Na Constituição Federal de 1988, o princípio da solidariedade está presente no artigo 3º da Constituição Federal de 1988, no qual se refere aos objetivos da República, basicamente centrados na construção de sociedade livre, justa e solidária. Desse modo para fundamentar esse contexto, Moraes (2008, p. 2) informa que "[...] de acordo com o que estabelece o texto da Lei Maior, a configuração do nosso Estado Democrático de Direito tem por fundamentos a dignidade da pessoa humana, a igualdade substancial e a solidariedade social [...]", o que demonstra o objetivo de se obter o desenvolvimento do país, através do princípio da solidariedade, a fim de diminuir a desigualdade social e aumentar a qualidade de vida de seus cidadãos. 


A incessante busca pela melhora da condição de vida das pessoas não é por acaso, pois, existem motivos de o princípio estar presente na Constituição Federal de 1988, como declaram as autoras Terra e Pellegrini (2012, p. 80), "[...] o primeiro, de ordem interna, deve-se ao fato de o país ter passado por um período ditatorial longo, em que vários dos direitos básicos dos indivíduos foram suprimidos[…]”. Após esse período sombrio, com Constituição de 1988 e as leis infraconstitucionais como o Código Civil e o ECA os direitos e as novas reconfigurações familiares estabeleceram a solidariedade como princípio o que revela em seu caráter a essencialidade deste em relação às famílias. 



Nucleo Científico Interno (NCI)


Dra. Andreza da Silva Jacobsen

Dr. Edmundo Rafael Gaievski Junior.



REFERÊNCIAS



AZEVEDO, Álvaro Villaça. Estatuto da Família de Fato: de acordo com o novo código civil, Lei n° 10.406, de 10-01-2002. 2. Ed. – São Paulo: Atlas, 2002.


Beckenkamp, Cristine; BRANDT, Fernanda. A recente mudança na estruturação de modelo familiar: o princípio da solidariedade como instrumento de concretização das novas famílias. In: XVI Seminário Internacional, demandas sociais e políticas públicas na sociedade contemporânea - XII Mostra internacional de trabalhos científicos. Universidade Santa Cruz do Sul, 2019. Disponível em: https://online.unisc.br/acadnet/anais/index.php/sidspp/issue/view/127. Acesso em: 18 out. 2024. 


BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 18 set. 2024.



DIAS, Maria Berenice. Manual de Direitos das Famílias. 4 ed. 11ª ed. impressa. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016.


LÔBO, Paulo Luiz Netto. A paternidade socioafetiva e a verdade real. Revista CEJ. v. 10, n. 34, 2007.


MORAES, Maria Celina Bodin de. O princípio da solidariedade. In: MATOS, Ana Carla Harmatiuk. (Org.). A construção dos novos direitos. Porto Alegre: Núria Fabris, 2008.


TERRA, Rosane B. M. da R. Barcellos; PELLEGRINI, Grace Kellen de Freitas. Interrelações entre o direito público e o privado: uma abordagem do princípio da solidariedade nas relações privadas. In: REIS, Jorge Renato dos; Cerqueira, Kátia Leão (organizadores). Santa Cruz do Sul, Editora IPR, 2013. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. 8ª ed. 2ª reimpr. São Paulo: Atlas, 2008.


VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. 8ª ed. 2ª reimpr. São Paulo: Atlas, 2008.

 
 
 

Posts recentes

Ver tudo

Comentários


Fale com nossos Advogados

Entre em contato para agendar uma consulta jurídica

Escolha a área de atuação
bottom of page