A questão dos planos de saúde e a abusividade das cláusulas contratuais
- Andreza Jacobsen
- 6 de dez. de 2024
- 4 min de leitura
Os planos de saúde desempenham um papel crucial no acesso à saúde no Brasil, proporcionando cobertura para consultas, exames, internações e procedimentos médicos. Contudo, a relação entre consumidores e operadoras nem sempre é equilibrada. Um dos principais problemas enfrentados pelos usuários são as cláusulas abusivas, que violam direitos básicos previstos no Código de Defesa do Consumidor (CDC) e colocam o contratante em situação de desvantagem excessiva.
As Cláusulas abusivas são disposições contratuais que desequilibram a relação entre as partes, beneficiando desproporcionalmente uma delas. No caso dos planos de saúde, essas cláusulas frequentemente restringem direitos fundamentais do consumidor, seja por limitações de cobertura, carências desproporcionais ou exclusões de tratamentos essenciais.
Trazendo a Súmula nº 608 do STJ, percebemos a possibilidade da aplicação do Código de Defesa do Consumidor, nos contratos de plano de saúde: "Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão”.
São exemplos de Cláusulas Abusivas nos Planos de Saúde:
Limitação de Cobertura: Exclusão de doenças ou tratamentos previstos no Rol de Procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
Carências Exageradas: Prazo excessivamente longo para a utilização de serviços essenciais, como exames e internações de emergência.
Reajustes por Faixa Etária: Aumento de mensalidades de forma desproporcional, especialmente para idosos, o que fere o princípio da dignidade da pessoa humana.
Rescisão Unilateral do Contrato: Cancelamento do plano por inadimplência sem respeitar os prazos ou os direitos do consumidor.
O CDC e a Lei nº 9.656/98, que regula os planos de saúde no Brasil, são instrumentos fundamentais na proteção dos consumidores. Eles determinam:
A nulidade de cláusulas abusivas.
A obrigatoriedade de cobertura mínima para os beneficiários.
A proibição de discriminação por idade, sexo ou condições preexistentes.
Segundo o artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor: Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis.
No que tange a possibilidade de escolha do índice de reajuste de forma unilateral por operadora de plano de saúde, a mesma é abusiva, bem como qualquer alteração nos preços, devendo ter a participação do consumidor, sob pena de ser considerada nula, conforme entendimento dominante:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. REAJUSTE COMPLEMENTAR DE PLANO DE SAÚDE. APLICAÇÃO DE ÍNDICE UNILATERALMENTE ESCOLHIDO. VEDAÇÃO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. 1.- É abusivo o reajuste de plano de saúde pelo índice que melhor atende aos interesses do fornecedor, sem que se acorde ou se dê ao consumidor qualquer informação a respeito do critério adotado. Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no Ag: 1087391 SP 2008/0179964-3, Relator: Ministro SIDNEI BENETI, Data de Julgamento: 16/04/2009, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 05/05/2009). “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. PLANO DE SAÚDE. ALTERAÇÃO UNILATERAL DO CONTRATO. INTERNAÇÃO EM HOSPITAL NÃO CONVENIADO. CDC. BOA-FÉ OBJETIVA. 1. A operadora do plano de saúde está obrigada ao cumprimento de uma boa-fé qualificada, ou seja, uma boa- fé que pressupõe os deveres de informação, cooperação e cuidado com o consumidor/segurado. 2. No caso, a empresa de saúde realizou a alteração contratual sem a participação do consumidor, por isso é nula a modificação que determinou que a assistência médico hospitalar fosse prestada apenas por estabelecimento credenciado ou, caso o consumidor escolhesse hospital não credenciado, que o ressarcimento das despesas estaria limitado à determinada tabela. Violação dos arts. 46 e 51, IV e § 1º do CDC. 3. Por esse motivo, prejudicadas as demais questões propostas no especial. 4.Recurso especial provido.”(STJ, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 10/03/2009, T4 - QUARTA TURMA).
Constantemente, as decisões judiciais têm reforçado o direito dos consumidores. Os Tribunais frequentemente conforme a jurisprudência, anulam cláusulas que restringem tratamentos ou determinam a cobertura de procedimentos essenciais, mesmo fora do rol da ANS, quando comprovada sua necessidade.
A imposição de cláusulas abusivas prejudica não apenas a saúde física e mental dos consumidores, mas também a confiança no sistema de saúde suplementar. O desrespeito aos direitos do usuário pode resultar em ações judiciais, gerando custos adicionais para as operadoras e sobrecarregando o Poder Judiciário.
O combate às cláusulas abusivas nos contratos de planos de saúde é essencial para garantir o acesso digno à saúde, como previsto na Constituição Federal. Cabe ao consumidor estar atento aos seus direitos e, às autoridades competentes, fiscalizar e punir práticas irregulares. Dessa forma, é possível equilibrar a relação contratual e assegurar que os planos de saúde cumpram seu papel social, oferecendo cobertura de qualidade e respeitando os direitos de seus beneficiários.
Núcleo Científico Interno (NCI)
Dra. Andreza da Silva Jacobsen
Dr. Edmundo Rafael Gaievski Junior.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Senado Federal. Lei nº 8.078/1990. Código de Defesa do Consumidor. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/533814/cdc_e_normas_correlatas_2ed.pdf. Acesso em: 06 dez. 2024.
BRASIL. Ministério da Saúde. Resolução Normativa ANS nº 560, de 15 de dezembro de 2022. Dispõe sobre o Sistema de Cadastro de Planos Privados de Assistência à Saúde comercializados anteriormente à data de vigência da Lei nº 9.656, de 3 de junho de 1998. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/ans/2023/res0560_02_01_2023_rep.html.
MORAES, Monique Magalhães. Planos de saúde e cláusulas abusivas. OAB Niterói. II Manual Básico de Direito Médico e da Saúde (Ebook) 2022/2024. Disponível em: https://oabniteroi.org/esa/. Acesso em: 06 dez. 2024.
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