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A Obrigação da Azul em conceder voucher após descumprir programa de benefícios: Análise à luz do Código de Defesa do Consumidor.

  • Foto do escritor: Andreza  Jacobsen
    Andreza Jacobsen
  • 19 de nov. de 2024
  • 5 min de leitura

A decisão da juíza Karinne Thormin da Silva, do 5º Juizado Especial Cível de Goiânia, condenou a Azul Linhas Aéreas a fornecer um voucher a um cliente que não obteve o upgrade para a classe executiva prometido pelo programa de fidelidade do cartão de crédito Visa Infinite Azul. O caso levanta importantes questões sobre os direitos dos consumidores quando uma empresa não cumpre com as ofertas publicadas em seus programas de benefícios e sobre como as disposições do Código de Defesa do Consumidor (CDC) se aplicam nesses contextos.


No caso em questão, a companhia aérea negou o upgrade, alegando a indisponibilidade de assentos na classe executiva, mesmo diante de provas apresentadas pelo cliente que indicavam a existência de assentos disponíveis. Diante do descumprimento, o tribunal determinou a concessão de um voucher, conforme as regras do programa de fidelidade, com validade exclusiva para voos internacionais. Desse modo aqui se discute as implicações dessa decisão à luz dos direitos do consumidor, com foco na transparência e na boa-fé contratual.


O programa de fidelidade do Visa Infinite Azul oferece aos clientes benefícios como o upgrade de cabine para a classe executiva, quando atingem o patamar de 100 mil pontos, conforme os termos estabelecidos pela empresa. Ao acumular essa quantidade de pontos, o cliente tem direito a dois vouchers anuais para upgrades, sujeitos à disponibilidade de assentos. No caso analisado, o cliente, ao tentar utilizar o benefício, se deparou com a negativa da Azul, que alegou falta de assentos na classe executiva.


O autor da ação, por sua vez, apresentou evidências que demonstravam que, naquele voo específico, havia assentos disponíveis na classe executiva, o que contradizia a alegação da empresa. A Azul, por sua parte, não conseguiu comprovar adequadamente que a classe executiva estava de fato lotada. A companhia se limitou a apresentar trechos dos termos de uso do programa de fidelidade e não forneceu documentos ou registros que comprovassem a indisponibilidade dos assentos.


A magistrada, portanto, entendeu que, em uma situação como essa, caberia à Azul a prova da inexistência de assentos, o que não ocorreu. O não cumprimento da oferta, associada à falta de comprovação suficiente, resultou na condenação da empresa a fornecer um voucher ao cliente, válido exclusivamente para voos internacionais.


Nessa situação aplicando o Código de Defesa do Consumidor (CDC) este é instrumento legal fundamental que regula as relações de consumo no Brasil, com o objetivo de equilibrar as relações entre fornecedores e consumidores, protegendo este último contra práticas comerciais desleais e garantindo seus direitos em situações de descumprimento de ofertas e contratos.

No caso em questão, é possível identificar algumas disposições do CDC que foram violadas pela Azul. O artigo 35 do CDC estabelece que, em caso de descumprimento da oferta, o consumidor tem o direito de exigir o cumprimento da obrigação ou pedir uma compensação adequada, como no caso do voucher concedido pela empresa.


O artigo 6º, inciso III, do CDC também garante o direito do consumidor à informação clara e adequada sobre os serviços prestados, o que inclui as condições para o usufruto de benefícios em programas de fidelidade. Nesse sentido, a Azul deveria ter sido mais transparente ao informar sobre as condições e limitações de uso do benefício de upgrade, especialmente em relação às restrições de disponibilidade de assentos.


O descumprimento do programa de benefícios e a negativa do upgrade configuram uma falha na prestação de serviço, violando o direito do consumidor à qualidade e à efetividade dos serviços contratados. O artigo 6º, inciso VI, do CDC também assegura o direito à reparação integral dos danos, que, neste caso, foi atendido parcialmente pela concessão do voucher, mas com uma limitação geográfica (somente para voos internacionais).


A decisão judicial de conceder um voucher ao cliente como forma de reparação pode ser vista como uma solução intermediária, mas também suscita discussões sobre a adequação dessa compensação. O voucher é uma forma de compensação que atende ao regulamento do programa de fidelidade, permitindo ao cliente usufruir do benefício prometido, embora com restrições em relação à sua aplicabilidade (somente para voos internacionais).


No entanto, a questão que se coloca é se o voucher realmente compensa o prejuízo do consumidor, considerando que ele pode ter sido prejudicado por não ter conseguido usufruir do upgrade quando desejava, independentemente dos assentos estarem disponíveis ou não. A reparação através do voucher pode ser vista como uma solução favorável para a empresa, uma vez que ela limita o valor da compensação (já que o benefício é restrito a voos internacionais), mas pode não ser suficiente para a reparação integral do dano, como estabelecido no art. 6º, inciso VI, do CDC.


O programa de fidelidade da Azul, como o de outras companhias aéreas, estabelece condições claras para o uso dos benefícios, como o upgrade de cabine, que está sujeito à disponibilidade de assentos. Contudo, a forma como essas condições são comunicadas ao consumidor e a forma como a empresa lida com a disponibilidade dos assentos deveriam ser mais transparentes. A falta de clareza nas informações prestadas pela Azul no momento da negativa ao cliente pode é considerada uma falha na transparência e na boa-fé contratual, estes, dois princípios fundamentais do CDC.


A empresa, em sua defesa, alegou que o benefício era aplicável apenas a voos internacionais e para determinadas classes tarifárias. No entanto, essa informação deveria ser claramente comunicada ao consumidor desde o início, de maneira a evitar situações de frustração e conflito, como ocorreu neste caso. A falha na comunicação das condições de uso do benefício é uma violação dos direitos do consumidor, que deve ser informado de maneira clara e precisa sobre as limitações e exigências para usufruir dos benefícios prometidos.


A condenação da Azul Linhas Aéreas a conceder um voucher ao cliente após descumprir as condições do programa de benefícios ilustra a aplicação dos direitos do consumidor previstos no Código de Defesa do Consumidor. A empresa falhou em comprovar a indisponibilidade do benefício e não cumpriu com a oferta de upgrade para a classe executiva, o que configurou uma falha na prestação do serviço. Embora a concessão do voucher tenha sido uma solução para a reparação do dano, o caso levanta questões sobre a adequação dessa forma de compensação e sobre a transparência e boa-fé nas relações comerciais.


O caso em questão, fica evidente que a empresa deve cumprir com as promessas feitas em seus programas de fidelidade e garantir que seus consumidores tenham acesso a informações claras e completas sobre os benefícios oferecidos. Desse modo, a reparação dos danos deve ser adequada e proporcional ao prejuízo sofrido, conforme estabelece o CDC, afim de garantir uma relação de consumo justa e equilibrada.



Núcleo Científico Interno - (NCI)

Dra. Andreza Jacobsen

Dr. Edmundo Rafael Gaievski Júnior



REFERÊNCIAS


BRASIL. Senado Federal. Lei nº 8.078/1990. Código de Defesa do Consumidor. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/533814/cdc_e_normas_correlatas_2ed.pdf. Acesso em: 19 nov. 2024. 


MIGALHAS. Azul deve conceder voucher após descumprir programa de benefícios. Migalhas, 2024. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/quentes/419647/azul-deve-conceder-voucher-apos-descumprir-programa-de-beneficios. Acesso em: 19 nov. 2024. 

 
 
 

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